segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Segurança Pública - Principais fornecedores de armas ilegais estão na Bolívia e Paraguai

Armas ilegais abastecem crime organizado em capitais como SP e RJ. Polícia Rodoviária Federal pede investimento em máquinas de raio-x.

Armas e munições que entram ilegalmente no Brasil têm um único objetivo: abastecer o crime organizado nas grandes capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Segundo a Polícia Federal (PF), em todo o Brasil, foram cerca de 12,6 mil apreensões no ano passado. São Paulo é o estado onde mais foram apreendidas armas ilegais em 2009: quase 4,7 mil.

“Elas se destinam sem dúvida alguma a grupos que se dedicam a assalto a banco ou ataques a próprios policiais”, diz Roberto de Campos Andrade, promotor.

Para combater este crime, de acordo com a PF, a principal dificuldade é que os criminosos costumam fazer o transporte das armas por rotas alternativas, onde, com certeza, não existe nenhuma fiscalização. “Nós não temos homens suficientes para evitar essa passagem imediata dessa arma para território brasileiro”, explica José Rita Martins Lara, superintendente da PF.

Para a Polícia Rodoviária Federal, é preciso investimento em tecnologia. “Nós precisamos que o estado brasileiro invista em tecnologia. São tecnologias de raio-x , que vai nos auxiliar muito na fiscalização de grandes caminhões e de grandes cargas”, disse Valter Favaro, comandante da Polícia Rodoviária Federal.

O caminho das armas

A reportagem mapeou as principais rotas de tráfico ilegal de armas para o Brasil. Tudo começou em uma rua deserta, onde aconteceu um flagrante, com a câmera de segurança mostrando quando o motorista do caminhão entrega para um homem pacotes e sacolas.

Dentro, há revólveres e munição, acreditava a polícia. Tudo foi depositado no porta-malas de um carro. A última entrega é uma arma longa, levada tranquilamente pelo comparsa do caminhoneiro.

“Essa arma longa pode ser uma escopeta, pode ser um fuzil”, diz Wilson Negrão, delegado.

As imagens, que foram gravadas em maio, deram início a uma investigação sobre o comércio de armas ilegais na região de Sorocaba, interior paulista.

Com as placas do carro e do caminhão que pararam na rua, a Polícia descobriu os nomes de quatro suspeitos de envolvimento com o trafico de armas: um pai e três filhos. O caminhoneiro é Josias Oliveira, de 57 anos. Nesta semana, ele e os filhos foram presos.

Transporte

O motorista era funcionário de uma transportadora. Segundo a polícia, durante um ano, ele aproveitou as viagens que fazia para Argentina, Uruguai e Paraguai, para trazer o armamento escondido.

Os criminosos chegaram a encomendar munição para metralhadora ponto 50, que derruba helicóptero e fura blindagem de carro forte.

Por meio de grampo, foi descoberto um diálogo entre um homem não identificado e o caminhoneiro.

"Você tá aonde", questiona, e ouve a resposta: "Eu to aqui no Uruguai". Em seguida, nova pergunta: "Será que tem como arrumar aquele negócio de ponto 50, aí? Se você conseguir, me liga aqui. Mas é preciso", diz.

'Tráfico formiguinha'

O caminhoneiro foi preso numa estrada de São Paulo. O veículo partiu do Uruguai e passou pelo Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. No caminhão, a polícia encontrou um rifle. Já na casa dele, havia cinco bananas de dinamite e cinco armas. Ere elas, um fuzil de cano cortado. Também foram descobertas mais de 400 munições. Estas para metralhadora ponto.50.

“Eu comprava porque eu gostava delas assim pra ter uma arma. E a munição eu vinha comprando sem intenção de nada”, afirma Josias Oliveira, o caminhoneiro preso. Segundo a polícia, o caminhoneiro fazia o chamado tráfico de formiguinha e os filhos revendiam as armas.

“Nós observamos que as quantidades não eram grandes. Mas sim, varias viagens”, disse Wilson Negrão, delegado. As investigações revelam que, é assim, de pouco em pouco, que chega a maior parte das armas ilegais ao Brasil e que os principais fornecedores estão na Bolívia e no Paraguai.

Bolívia

Segundo a polícia brasileira, é fácil conseguir comprar armas na Bolívia. Na cidade de San Ignacio de Velasco, por exemplo, há pontos de venda de armas ilegais. A reportagem percorreu o comércio, simulando interesse em comprar fuzis e metralhadoras. A notícia se espalha. A equipe está em San Ignacio há menos de uma hora., quando um homem faz contato.

Ele se apresenta como Pablo, conta que pode intermediar o negócio clandestino. Mas é que conversar com um policial. "Polícia", pergunta a reportagem. "Hã, hã", diz ele. "Mas ele pode saber", questiona. "Não tem problema", afirma o traficante.

Ele conduz o repórter até um homem que usa roupa militar e se diz soldado da polícia nacional boliviana. Pablo afirma que é o soldado quem vai fornecer as armas. Em outro encontro, duas horas depois, o negociador aparece sozinho e conta o que conseguiu.

"Escopeta 12. Valibre 12. Fe 8 tiros. Tá 600 dólares. Tem duas", afirmou. A arma que ele oferece custa cerca de R$ 1.050. O negociador ainda promete uma metralhadora, por R$ 2,6 mil. “Uzi, tipo metralhadora pequena. Sao dois carregadores de 30 tiros. Com silenciador. US$1,5 mil", acrescenta.

Segundo o homem que se identificou como Pablo, o soldado boliviano tem à disposição outras armas de uso restrito. "Você nao perguntou se ele tem algum fuzil?". E ouve a resposta: "Perguntei. Ele disse que ele pode pegar sim", afirmou.

À noite, o negociador fala que a entrega será em outra cidade, Santa Cruz de La Sierra, a 400 quilômetros de distância, e que o pagamento tem que ser feito lá, em dinheiro vivo.

Após o último encontro com o negociador, a reportagem anda duas horas por uma estrada e chega ao primeiro posto de fiscalização. Não tem nenhum policial boliviano para fazer o controle de quem entra e de quem sai do país. Já perto da fronteira, há outro posto boliviano, com pessoas trabalhando, e uma base do Exército brasileiro.

Violência

Antes da prisão, os filhos do caminhoneiro que trazia armamento escondido não estavam nem um pouco preocupados com o aumento da violência. "Estão matando os policiais, você viu? Derrubaram helicóptero", diz um. "Maior guerra", outro responde.

“Isso representa um grande risco à sociedade, porque está alimentando um tipo de criminalidade já bem violenta”, disse Roberto de Campos Andrade, promotor.
Fonte: G1

Nenhum comentário: